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Existência de grupo econômico não basta para desconsideração da personalidade jurídica e extensão da falência

A 4a Turma do STJ, ao julgar o REsp 1.897.356, definiu que, para haver a desconsideração da personalidade jurídica e a extensão da falência, é preciso que seja demonstrado de que forma foram transferidos recursos de uma empresa para outra, ou comprovar abuso ou desvio da finalidade da empresa em relação à qual se pede a desconsideração, a partir de fatos concretamente ocorridos em detrimento da pessoa jurídica prejudicada.

No caso analisado, com esse entendimento, foram cassados os efeitos da extensão da falência decretada contra três empresas, cujos bens foram atingidos no processo falimentar de uma companhia têxtil com a qual mantinham relação econômica, sob a alegação de que o grupo econômico teria maquiado relações comerciais, motivo pelo qual deveriam ser atingidos os bens das pessoas jurídicas coligadas.

Em recurso ao STJ, as empresas alegaram que não teriam sido apontados os requisitos do artigo 50 do Código Civil para a desconsideração da personalidade jurídica das empresas recorrentes e para a consequente extensão dos efeitos da falência.

Segundo a relatora do recurso, ministra Isabel Gallotti, para desconsiderar a personalidade jurídica de uma empresa é necessário verificar se existe confusão patrimonial com a falida ou desvio de finalidade.

No caso em julgamento, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro manteve a extensão da falência, com base na descrição que o laudo pericial fez das transações estabelecidas entre as sociedades empresárias, desde o repasse da matéria prima até a venda do produto industrializado.

Para a relatora, contudo, essa relação das empresas não permite concluir pela existência dos elementos necessários à desconsideração da personalidade jurídica e à extensão da falência. Isso pois o tipo de relação comercial ou societária travada entre as empresas, ou mesmo a existência de grupo econômico, por si só, não é suficiente para ensejar a desconsideração da personalidade jurídica. Igualmente não é relevante para tal finalidade perquirir se as empresas recorrentes agiram com a intenção de ajudar a falida ou com o objetivo de lucro.

Segundo a minustra, a afirmação genérica de que os custos e riscos ficavam exclusivamente com a falida e os lucros com as demais empresas não é amparada em nenhum elemento de prova do processo, assim como não ficou demonstrada de forma objetiva a confusão patrimonial.

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STJ fixa contrapartida para proteção do imóvel da empresa usado para moradia

A 4a Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp 1.514.567, concluiu que o Poder Judiciário pode oferecer ao imóvel de propriedade da empresa, que é usado para moradia dos sócios, a proteção contra penhora que a Lei 8.009/1990 confere aos bens de família. Mas, em troca, o patrimônio pessoal dos empresários poderá ser alcançado para saldar a dívida, caso necessário.

O caso analisado envolve a cobrança de uma dívida por meio da penhora de quotas sociais de uma empresa de propriedade dos devedores, cujos socios se insurgiram porque o capital da pessoa jurídica é composto por um imóvel usado por eles próprios como moradia. Requisitaram a desconsideração positiva da personalidade jurídica, na qual a autonomia patrimonial entre empresa e sócios é rompida não para alcançar, mas para proteger um bem, no caso a residência da família.

Para o Tribunal de Justiça de São Paulo, o imóvel pode ser penhorado porque pertence à pessoa jurídica e a proteção de impenhorabilidade prevista pela Lei 8.009/1990 se restringe aos bens de família das pessoas físicas.

A jurisprudência do STJ, no entanto, tem diversos precedentes indicando a possibilidade de considerar impenhorável o imóvel de empresa que é usado como residência. A posição se baseia no escopo da lei de conferir ampla proteção ao direito de moradia.

Em seu voto, a ministra Isabel Gallotti destacou que o uso dessa medida na jurisprudência do STJ, inicialmente, limitou-se aos casos de imóvel de pequenas empresas familiares, cujas quotas são inteiramente pertencentes aos devedores e seus familiares.

A tese, mais tarde, passou a ser aplicada de maneira indistinta, sem observar a circunstância que justificou a flexibilização do princípio da autonomia patrimonial. Por isso, a relatora propôs a definição de algumas medidas para balancear os julgamentos sobre o tema.

Para a ministra, a desconsideração da personalidade jurídica de empresa proprietária do imóvel no qual residem seus sócios, para que esse bem seja considerado impenhorável, só pode ser feita na hipótese de pequena empresa familiar.

Também deve-se levar em conta a boa-fé do sócio morador. Isso implica analisar, caso a caso, se há indícios de que, por exemplo, o imóvel já era usado como moradia antes do vencimento da dívida ou se, ao contrário, passou a ser justamente para evitar sua penhora.

Condutas como a compra pela sociedade de imóveis residenciais para a moradia dos sócios, de forma a destituir a empresa de patrimônio apto a servir de meio para a satisfação das obrigações contraídas no giro de seus negócios, não devem dar ensejo a esse tipo de desconsideração.

Por fim, destacou que a desconsideração da personalidade jurídica deve ser uma via de mão dupla. Se é possível tornar o imóvel da empresa impenhorável para garantir a moradia dos devedores, também deve ser possível atingir o resto do patrimônio pessoal deles para saldar a dívida.

A tese foi acolhida pelos ministros da turma, mas não foi aplicada no caso concreto porque não há certeza sobre o imóvel ser, de fato, residência da família dos devedores. Como o acórdão não apreciou a prova sobre o tema, determinou-se o retorno dos autos às instâncias ordinárias para novo julgamento.