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STJ decide que paralisia da execução por falta de bens do devedor não dá margem ao reconhecimento da supressio

A 4a Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o REsp 1717144, afastou o reconhecimento da supressio em execução que ficou suspensa, por longo período, por não terem sido encontrados bens do devedor. Com a decisão, o colegiado determinou a incidência de juros e correção monetária, na forma fixada em sentença, durante todo o período de existência da dívida, até a data do efetivo pagamento.

Pelo instituto da supressio há a supressão de um direito contratual em razão de sua não utilização durante certo tempo, fazendo surgir na parte contrária a expectativa de que não será mesmo utilizado.

No caso analisado, um banco ajuizou ação monitória, baseada em contrato de crédito rotativo, contra uma empresa e seus sócios. O juízo condenou os devedores ao pagamento do valor pleiteado pela instituição financeira.

Na fase de execução, o Tribunal de Justiça de São Paulo afastou a ocorrência de prescrição intercorrente, mas, com base no instituto da supressio, decidiu que não seriam computados juros nem correção monetária sobre a dívida durante o período em que o processo esteve sobrestado por não terem sido encontrados bens em nome dos executados, ao argumento de que teria se privilegiado com a incidência dos encargos enquanto permanecia inerte, sem tomar medidas para encontrar patrimônio dos devedores e permitir o regular processamento da execução.

Ao analisar o recurso especial interposto contra o acórdão do TJSP, o relator, ministro Antonio Carlos Ferreira, destacou que, apesar de o instituto da supressio ter seu fundamento na necessidade de estabilização das relações jurídicas, ele não se confunde com a extinção de direitos que ocorre na prescrição ou na decadência.

O ministro afirmou que, para o reconhecimento da supressio, é preciso verificar acerca da boa-fé, do dever de lealdade e confiança, ao contrário do que ocorre na prescrição e na decadência, em que o mero transcurso do tempo implica a extinção do direito. A supressio, portanto, exige uma análise da omissão do credor e também do seu efeito quanto à expectativa do devedor.

No caso em julgamento, Antonio Carlos Ferreira observou que não é possível aplicar o instituto da supressio, pois a inexistência de bens no processo de execução não pode ter levado o réu à expectativa legítima de que não seria mais executado, nem ser considerada omissão relevante para a extinção do direito, na medida em que o direito do exequente foi efetivamente exercido ao ajuizar a ação e ao ser dado início ao cumprimento da sentença transitada em julgado.

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STJ decide que penhora de fundo de investimento não transforma exequente em cotista

A 3a Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp 1.885.119, definiu que a penhora de cotas de fundo de investimento não confere automaticamente ao credor exequente a condição de cotista, não o sujeitando aos riscos provenientes dessa espécie de aplicação.

Com base nesse entendimento, por unanimidade, o colegiado deu provimento a recurso especial da Fundação dos Economiários Federais (Funcef) e definiu que eventuais oscilações de valor das cotas de fundo de investimento pertencentes ao executado não podem prejudicar nem beneficiar a parte exequente, à qual não é possível repassar valor superior ao do título em execução.

O caso analisado tratou de execução que envolveu cotas de um fundo de investimento. Houve valorização das cotas antes do resgate, e a Funcef questionou a decisão que, em cumprimento de sentença, determinou a expedição de mandados de pagamento em favor das partes quanto ao montante reservado na conta judicial.

A Funcef sustentou não ser direito da exequente receber a mais por conta de valorização das cotas, alegando excesso indevido, além da necessidade de se observar o princípio da fidelidade ao título.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) entendeu que, por aceitar a penhora sobre cotas de fundo de investimento, a exequente passou a integrar aquele negócio jurídico, assumindo a condição de investidora do fundo e se sujeitando aos riscos inerentes, ao menos em relação às cotas representativas do seu verdadeiro crédito.

Segundo o relator no STJ, ministro Marco Aurélio Bellizze, o objetivo da penhora é preservar os bens para o efetivo e oportuno cumprimento da obrigação – tornando ineficaz, em relação ao exequente, qualquer ato de disposição praticado pelo executado –, mas ela não interfere no direito de propriedade do devedor enquanto não operada a expropriação final.

Para o ministro, quando a constrição incide sobre cotas de fundo de investimento – espécie de valores mobiliários, incluídos no rol legal de preferência de penhora, conforme indicam o artigo 835, III, do Código de Processo Civil (CPC) e o artigo 2º, V, da Lei 6.385/1976 –, a propriedade desses bens se mantém com o devedor investidor, até o resgate ou a expropriação final.

Bellizze considerou indevida a transferência ao exequente da circunstância inerente a esse tipo de negócio jurídico (que vincula apenas os cotistas contratantes), pois não seria possível lhe impor os ônus nem atribuir os bônus respectivos, ainda mais diante do princípio da relatividade dos efeitos do contrato.

Por outro lado, acrescentou o ministro, a superveniente valorização das cotas exige que seja excluída, no momento do efetivo pagamento, a importância que superar o crédito exequendo devidamente atualizado e acrescido dos encargos legais – sob pena de se incorrer em indevido excesso de execução, atingindo valor superior àquele constante do título executivo, nos termos do artigo 917, parágrafo 2º, I e II, do CPC.

No caso analisado, ao decidir pela reforma do acórdão do TJRJ, Marco Aurélio Bellizze limitou o valor a ser levantado pela parte exequente àquele efetivamente constante do título executivo judicial, devidamente atualizado e acrescido de juros de mora e honorários de advogado.

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STJ decide que prazo prescricional só pode ser interrompido uma vez

A 4a Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao examinar o REsp 1.786.266, decidiu que, nos termos do artigo 202 do Código Civil, não é possível a dupla interrupção da prescrição, mesmo se uma delas ocorrer por causa extrajudicial e a outra for em decorrência de citação processual.

O entendimento foi aplicado pelo colegiado ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios que, admitindo a dupla interrupção do prazo prescricional, julgou improcedentes embargos à execução que questionavam a prescrição de duplicatas.

Ao analisar o caso, a primeira instância afastou a prescrição, por considerar que houve mais de uma interrupção do prazo – pelo protesto cambial e pelo ajuizamento, por parte do devedor, de ação de cancelamento das duplicatas e do respectivo protesto.

No recurso especial apresentado ao STJ, a empresa recorrente apontou violação do Código Civil e defendeu que a prescrição só poderia ser interrompida uma vez.  

O relator, ministro Antonio Carlos Ferreira, explicou que o Código Civil de 2002 inovou ao prever que a interrupção da prescrição deverá ocorrer uma única vez, com a finalidade de impedir a eternização do direito de ação mediante constantes interrupções do prazo, evitando a perpetuidade da incerteza e da insegurança nas relações jurídicas.

O relator observou que o legislador, ao determinar a unicidade da interrupção prescricional, não diferenciou, para a aplicação do princípio, a causa interruptiva em razão de citação processual daquelas ocorridas fora do processo judicial.

Em razão do princípio da unicidade da interrupção prescricional, mesmo diante de uma hipótese interruptiva extrajudicial (protesto de título) e outra em decorrência de ação judicial de cancelamento de protesto e título executivo, apenas admite-se a interrupção do prazo pelo primeiro dos eventos.

O ministro Antonio Carlos Ferreira citou, ainda, vários precedentes da Terceira Turma (REsp 1.504.408REsp 1.924.436 e REsp 1.963.067) que adotaram a mesma tese quanto à impossibilidade da dupla interrupção prescricional.

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STJ define que imóvel em construção pode ser considerado bem de família

A 4a Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp 1960026, entendeu que o fato de o devedor não residir no único imóvel de sua propriedade, que ainda está em fase de construção, por si só, não impede sua classificação como bem de família. Com isso, impediu a sua penhora.

No caso analisado, foi penhorado o imóvel em construção pertencente a um casal de idosos e o TJSP rejeitou a impugnação à penhora, sob o fundamento de que, para ser enquadrado na proteção da Lei 8.009/1990, o imóvel deve servir como residência, condição que não se aplicaria ao terreno com construção em andamento.

No recurso especial, o casal pediu que fosse reconhecida a impenhorabilidade do imóvel, alegando que se trata de sua futura moradia.

No STJ, o relator do recurso, ministro Marco Buzzi, afirmou que a interpretação das instâncias ordinárias não condiz com o disposto na Lei 8.009/1990, que objetiva a proteção da entidade familiar. Isso pois, as hipóteses permissivas da penhora do bem de família devem receber interpretação restritiva.

Explicou o ministro que a impenhorabilidade do bem de família busca amparar direitos fundamentais, tais como a dignidade da pessoa humana e a moradia, os quais devem funcionar como vetores axiológicos do nosso ordenamento jurídico.

Ele mencionou que a proteção legal alcança até mesmo o bem de família indireto, ou seja, o imóvel que é alugado para propiciar renda necessária à subsistência da família do devedor ou ao custeio de sua moradia (Súmula 486 do STJ).

O ministro destacou, também, o entendimento da 3a Turma no julgamento do REsp 1.417.629, quando ficou definido que o fato de um imóvel não ser edificado, por si só, não impede a sua qualificação como bem de família, pois esta depende da finalidade que lhe é atribuída – análise a ser feita caso a caso.

Conforme ressaltou o ministro, desde que não estejam configuradas as exceções à impenhorabilidade estabelecidas nos artigos 3º e 4º da Lei 8.009/1990, o imóvel deve ser considerado antecipadamente como bem de família, pois se trata de único imóvel de propriedade do casal, no qual pretende fixar sua residência.

O relator esclareceu, porém, que a impenhorabilidade do imóvel em discussão não pode ser reconhecida diretamente pelo STJ, pois é ao tribunal local que cabe analisar as provas sobre o atendimento dos requisitos legais do bem de família, e nem todos chegaram a ser examinados.

Assim, a Quarta Turma determinou o retorno do processo para que o TJSP reexamine o recurso do casal contra a decisão de primeiro grau, afastada a exigência de moradia no local como condição para o reconhecimento do bem de família.

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STJ decide pela preferência do crédito tributário mesmo sem penhora na execução fiscal

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento de embargos de divergência – EREsp 1603324 – definiu que a Fazenda Pública tem preferência para habilitar seu crédito na arrematação levada a efeito em processo executivo movido por terceiro, independentemente da existência de penhora na execução fiscal.

Por unanimidade, os ministros entenderam que, mesmo não havendo penhora na execução fiscal, garante-se o exercício do direito do credor privilegiado mediante a reserva da totalidade (ou de parte) do produto da arrematação do bem do devedor ocorrida na execução de terceiros.

Com o julgamento, o colegiado pacificou entendimentos divergentes entre a Primeira e a Quarta Turmas e deu provimento aos embargos de divergência interpostos pelo Estado de Santa Catarina contra acórdão da Primeira Turma que considerou necessário haver pluralidade de penhoras sobre o mesmo bem para ser instaurado o concurso de preferências.

O relator na Corte Especial, ministro Luis Felipe Salomão, explicou que o concurso universal – concorrência creditícia que incide sobre todo o patrimônio – não se confunde com o concurso singular de credores, quando mais de um credor requer o produto proveniente de um bem específico do devedor.

O magistrado acrescentou que, no caso analisado, o Estado de Santa Catarina possui crédito tributário que é objeto de execução fiscal, motivo pelo qual pleiteia a preferência frente aos demais credores da sociedade executada em concurso singular.

Destacou, também, que tanto o Código Civil (de 1916 e de 2002) quanto o Código de Processo Civil (de 1973 e de 2015) conferem primazia às preferências creditícias fundadas em regras de direito material , em detrimento da preferência pautada na máxima prior in tempore potior in iure, ou seja, o primeiro a promover a penhora (ou arresto) tem preferência no direito de satisfação do crédito.

Nessa perspectiva, a distribuição do produto da expropriação do bem do devedor solvente deve respeitar a seguinte ordem de preferência: em primeiro lugar, a satisfação dos créditos cuja preferência funda-se no direito material; na sequência – ou quando inexistente crédito privilegiado –, a satisfação dos créditos comuns (isto é, que não apresentam privilégio legal) deverá observar a anterioridade de cada penhora, ato constritivo considerado título de preferência fundado em direito processual.

O ministro lembrou, ainda, que a jurisprudência do STJ considera não ser possível sobrepor uma preferência processual a uma preferência de direito material, por ser incontroverso que o processo existe para que o direito material se concretize.

Dessa forma, vez que o privilégio do crédito tributário – artigo 186 do Código Tributário Nacional – é evidente também no concurso individual contra devedor solvente, é imperiosa a sua satisfação, independentemente de prévia execução e de penhora sobre o bem cujo produto da alienação se pretende arrecadar.

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STJ decide ser necessária ação rescisória para aplicação de decisão do STF para alterar título judicial

A 2a Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp 1.861.550, decidiu que não cabe ao juízo da execução alterar os parâmetros do título judicial, ainda que o objetivo seja adequá-los a uma decisão do Supremo Tribunal Federal no regime da repercussão geral. Só haverá possibilidade de alteração quando a coisa julgada for desconstituída.

Segundo o ministro relator do processo, Og Fernandes, a declaração de inconstitucionalidade gera duas consequências, quais sejam excluir a norma do sistema do direito e atribuir ao julgado uma qualificada força impositiva e obrigatória em relação a atos administrativos ou judiciais supervenientes, ou seja, atinge apenas os atos administrativos e judiciais futuros.

O ministro destacou decisão na qual o STF definiu que a declaração de inconstitucionalidade não produz a rescisão automática das sentenças anteriores que tenham adotado entendimento diferente, sendo necessário entrar com recurso ou ação rescisória, conforme o caso.

Nesse contexto, concluiu que, estando incólume a decisão exequenda acobertada pela coisa julgada, não é cabível ao juízo da fase de cumprimento de sentença alterar os parâmetros estabelecidos no título judicial, ainda que no intuito de adequá-los à decisão vinculante do STF.

A decisão do Col. STJ merece criticas.

Isso porque o STF sói analisar temas em debate no Poder Judiciário muitos anos depois, quando já ultrapassado, e muito, o prazo bienal para ação rescisória em várias ações.

Assim, ao se exigir o ajuizamento da ação rescisória para a adequação do caso, é certo que, em relação aos processos cujo prazo bienal já decorreu quando da decisão do STF, prevalecerá ordem judicial com determinação inconstitucional, com base na qual se expropriará bens do devedor, o que não se pode admitir dentro de um estado de direito.