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Receita Federal reconhece possibilidade de regimes tributários distintos entre empresas do mesmo grupo, desde que comprovada autonomia real

A Receita Federal do Brasil (RFB), por meio da Solução de Consulta COSIT nº 72/2025, publicada em 10 de abril de 2025, esclareceu os limites jurídicos e fiscais para a adoção de regimes de tributação distintos (lucro presumido e lucro real) por empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico. O entendimento reafirma a possibilidade da separação, desde que haja efetiva autonomia administrativa, operacional e patrimonial entre as pessoas jurídicas envolvidas.

O caso objeto da consulta envolveu a aquisição de uma empresa tributada pelo lucro presumido por uma pessoa jurídica optante pelo lucro real, com identidade de objeto social e vínculo societário. A empresa adquirida alegou operar de forma independente, com sede própria, marca distinta e gestão separada da controladora. Diante disso, questionou se poderia manter o regime do lucro presumido após a mudança no controle societário.

A Receita confirmou que a manutenção do lucro presumido é juridicamente possível, mesmo no contexto de controle societário por empresa do lucro real, desde que a pessoa jurídica demonstre atuação efetivamente autônoma. Foram destacados como elementos essenciais para essa caracterização a inexistência de confusão administrativa, ausência de compartilhamento de estruturas e separação patrimonial entre as entidades.

O parecer faz referência ao Parecer Normativo COSIT nº 4/2018, reafirmando que a identidade de objeto social, quadro societário ou administração, por si sós, não descaracterizam a legitimidade de regimes distintos. No entanto, se constatada a inexistência de autonomia material — especialmente nos casos de direção centralizada, operações integradas ou confusão entre receitas e despesas —, a fiscalização poderá aplicar o princípio da realidade e exigir a apuração unificada do IRPJ com base no lucro real.

O fisco também alertou que, nos casos em que fique demonstrada a atuação conjunta de empresas formalmente separadas, com confusão patrimonial ou ausência de independência operacional, poderá haver desconsideração das estruturas utilizadas e reconhecimento de um único contribuinte. Nessas hipóteses, é possível a responsabilização solidária entre as pessoas jurídicas envolvidas, nos termos do artigo 124 do Código Tributário Nacional (CTN).

A Solução de Consulta COSIT nº 72/2025 reforça a necessidade de consistência entre forma e substância em planejamentos societários com regimes tributários distintos.

  • Empresas pertencentes a um mesmo grupo que pretendam adotar estruturas paralelas devem manter documentação robusta, segregação efetiva de atividades, autonomia gerencial e controle patrimonial individualizado.
  • A fiscalização poderá desconsiderar a separação formal caso identifique elementos que indiquem artificialidade ou integração operacional entre as entidades.

O entendimento da Receita está alinhado com discussões recorrentes no CARF e jurisprudência administrativa sobre a validade de planejamentos societários fundados na autonomia de pessoas jurídicas sob controle comum, mas impõe um ônus probatório elevado para os contribuintes.

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Existência de grupo econômico não basta para desconsideração da personalidade jurídica e extensão da falência

A 4a Turma do STJ, ao julgar o REsp 1.897.356, definiu que, para haver a desconsideração da personalidade jurídica e a extensão da falência, é preciso que seja demonstrado de que forma foram transferidos recursos de uma empresa para outra, ou comprovar abuso ou desvio da finalidade da empresa em relação à qual se pede a desconsideração, a partir de fatos concretamente ocorridos em detrimento da pessoa jurídica prejudicada.

No caso analisado, com esse entendimento, foram cassados os efeitos da extensão da falência decretada contra três empresas, cujos bens foram atingidos no processo falimentar de uma companhia têxtil com a qual mantinham relação econômica, sob a alegação de que o grupo econômico teria maquiado relações comerciais, motivo pelo qual deveriam ser atingidos os bens das pessoas jurídicas coligadas.

Em recurso ao STJ, as empresas alegaram que não teriam sido apontados os requisitos do artigo 50 do Código Civil para a desconsideração da personalidade jurídica das empresas recorrentes e para a consequente extensão dos efeitos da falência.

Segundo a relatora do recurso, ministra Isabel Gallotti, para desconsiderar a personalidade jurídica de uma empresa é necessário verificar se existe confusão patrimonial com a falida ou desvio de finalidade.

No caso em julgamento, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro manteve a extensão da falência, com base na descrição que o laudo pericial fez das transações estabelecidas entre as sociedades empresárias, desde o repasse da matéria prima até a venda do produto industrializado.

Para a relatora, contudo, essa relação das empresas não permite concluir pela existência dos elementos necessários à desconsideração da personalidade jurídica e à extensão da falência. Isso pois o tipo de relação comercial ou societária travada entre as empresas, ou mesmo a existência de grupo econômico, por si só, não é suficiente para ensejar a desconsideração da personalidade jurídica. Igualmente não é relevante para tal finalidade perquirir se as empresas recorrentes agiram com a intenção de ajudar a falida ou com o objetivo de lucro.

Segundo a minustra, a afirmação genérica de que os custos e riscos ficavam exclusivamente com a falida e os lucros com as demais empresas não é amparada em nenhum elemento de prova do processo, assim como não ficou demonstrada de forma objetiva a confusão patrimonial.

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CSRF decide pela incidência de PIS/Cofins em contratos de rateio de custos e despesas

A 3ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais do CARF decidiu, por maioria de votos, que os valores recebidos por empresa de grupo econômico a título de reembolso ou ressarcimento por custos e despesas com serviços compartilhados, com base em contrato de rateio de custos e despesas (cost sharing agreement), integram as bases de cálculo do PIS e da Cofins (acórdão nº 9303-012.980).

Os denominados contratos de rateio de custos e despesas são acordos por meio dos quais sociedades pertencentes a um determinado grupo econômico determinam o modo e em que medida devem colaborar ou participar dos custos e despesas incorridas por uma das sociedades do grupo com serviços no interesse geral, ressarcindo-a sob a forma de reembolso, tendo essa concentração de custos e despesas por finalidade benefícios econômicos, como ganhos de escala.

De modo geral, os contribuintes têm adotado a posição de que, por serem meros reembolsos recebidos em razão da centralização de despesas e custos em determinada pessoa jurídica do grupo econômico, não configurariam receitas tributáveis pelo PIS e pela Cofins.

Por outro lado, as autoridades fiscais entendem que tais valores representariam efetiva remuneração por serviços prestados às demais empresas do grupo, configurando, portanto, receitas tributáveis pelas referidas contribuições.

A 3ª Turma da CSRF, ao analisar essa questão, entendeu que os valores recebidos a título de reembolso teriam natureza de receitas com prestação de serviços e, portanto, deveriam integrar as bases de cálculo do PIS e da Cofins.

Segundo o voto vencedor, a decisão de criação de pessoas jurídicas distintas é uma faculdade do contribuinte, de modo que todos os efeitos fiscais decorrentes dessa estrutura devem ser inteiramente reconhecidos por cada entidade, com base no disposto no artigo 123 do Código Tributário Nacional (CTN).

Ademais, o ordenamento jurídico pátrio só prevê duas hipóteses em que o gasto realizado por uma sociedade possa ser repassado para outra: consórcio e mandato, não sendo essas figuras verificadas no caso concreto.

Entendeu-se, ainda, que o intuito ou não de lucro é irrelevante para se resolver a questão, visto que o fato essencial seria que houve um acordo de vontades entre sociedades distintas, razão pela qual as respectivas personalidades não poderiam ser desconsideradas frente a atos válidos.

Dessa forma, concluiu-se que os valores recebidos pelo contribuinte não teriam natureza reembolso, mas sim de prestação de serviço, motivo pelo qual configurariam receitas tributáveis pelo PIS e pela Cofins.