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STJ decide que avalista que tomou empréstimo para saldar dívida sozinho não pode cobrar encargos do coavalista

​A 3a Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp 2.060.973, por unanimidade, decidiu que, na hipótese de aval simultâneo, o avalista não tem o direito de exigir do coavalista, em ação de regresso, a sua parte proporcional nos encargos de empréstimo contratado exclusivamente para liquidar o débito avalizado. Segundo o colegiado, o direito de regresso do avalista que paga sozinho toda a dívida garantida abrange apenas aquilo que foi objeto do aval, na proporção da quota-parte de cada um.

De acordo com o processo, dois empresários prestaram aval, simultaneamente, em favor de uma empresa, tendo por objeto a integralidade de dívida representada por Cédulas de Crédito Bancário. Cobrado, um dos avalistas pagou a totalidade da dívida e, em seguida, ajuizou ação de regresso contra o coavalista.

Além de metade do valor da obrigação avalizada, o autor da ação cobrou a metade dos encargos de um empréstimo que ele contratou exclusivamente para liquidar a dívida. O juízo de primeiro grau julgou a ação parcialmente procedente, condenando o coavalista a pagar sua parte em relação à dívida liquidada, mas afastando o dever de dividir os encargos do empréstimo contratado.

O Tribunal de Justiça de São Paulo, ao analisar o caso, entendeu que o réu não foi parte do contrato celebrado para quitar a dívida original e, portanto, não poderia ser submetido aos seus encargos.

No STJ, segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso especial ,o aval simultâneo é regido pela regra comum da solidariedade passiva: os garantidores poderão cobrar do devedor principal a totalidade da dívida e terão o direito de regresso contra o coavalista apenas pela quota-parte de cada um.

Assim, é possível concluir que, na hipótese de aval simultâneo, o avalista pode cobrar, regressivamente, do coavalista aquilo que despendeu sozinho para pagamento da dívida, na proporção da sua quota-parte.

Entretanto, a relatora destacou que a eficácia do aval se limita àquilo que foi pactuado, não podendo o avalista ser cobrado para além da garantia ofertada. Desse modo, se um dos avalistas contrata empréstimo para poder pagar o débito avalizado, não será possível estender os efeitos desse contrato ao coavalista que dele não fez parte e que com ele não concordou, salvo se houver uma estipulação negocial em contrário.

Portanto, o direito de regresso do avalista que paga, sozinho, toda a dívida garantida abrange, tão somente, aquilo que foi objeto do aval, na proporção da quota-parte de cada um.

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Lei dispensa assinatura de testemunhas em títulos executivos extrajudiciais assinados eletronicamente

Foi publicada a Lei 14.620 dispensando a exigência da assinatura de duas testemunhas em documento particular assinado de forma eletrônica, nos moldes permitidos pela legislação, para conferir ao documento a força de título executivo extrajudicial. A alteração está prevista no artigo 34 da nova lei, que inclui um novo parágrafo (§4º) ao artigo 784 do Código de Processo Civil.

O artigo 784, III do Código de Processo Civil classifica como título executivo extrajudicial o documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas. Com a inclusão do §4º, no entanto, não é mais exigida a assinatura das testemunhas se o documento for assinado pelo devedor em uma plataforma de assinatura eletrônica reconhecida pela legislação brasileira e que possibilite a conferência da lisura e validade da assinatura pelo próprio sistema.

A alteração tem impacto direto na execução de contratos firmados entre particulares, retirando um requisito que poderia ser objeto de impugnação e impor à parte interessada na execução um rito menos célere.

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STJ confirma que doação inoficiosa é verificada no momento da liberalidade

​A 3a Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao examinar o REsp 2.026.288, confirmou o entendimento que é na data da liberalidade que se determina se a doação realizada avançou sobre o patrimônio correspondente à legítima dos herdeiros necessários – o que a tornaria nula.

Decidiu-se que o excesso caracterizador da doação inoficiosa – que ultrapassa a metade do patrimônio do doador, incidindo na parte dos herdeiros necessários – não pode ser considerado no momento da morte do doador e da abertura da sucessão, conforme precedentes da corte.

No caso analisado, os herdeiros do falecido ajuizaram ação de nulidade de doação de imóvel contra a donatária. O juiz considerou a ação procedente e decretou a nulidade integral da doação, sob o fundamento de que o falecido, ao dispor de seu patrimônio, não observou o valor que deveria ser reservado aos herdeiros necessários.

O Tribunal de Justiça de São Paulo, por sua vez, deu parcial provimento ao recurso da donatária para limitar a nulidade à parte que teria excedido a porção disponível do patrimônio.

Ao interpor recurso especial, a beneficiária da doação sustentou que, seja ao tempo da liberalidade, seja ao tempo do falecimento, o bem doado pelo falecido era muito inferior aos ativos financeiros que ele possuía no exterior, os quais seriam capazes de garantir a legítima dos herdeiros.

Ao analisar o recurso, relatora no STJ, ministra Nancy Andrighi, destacou que o tema deve ser analisado conforme o disposto no artigo 549 do Código Civil (CC), ressaltando o entendimento consolidado da corte no sentido de que o excesso caracterizador desse tipo de doação deve ser considerado no momento da liberalidade, e não no momento do falecimento do doador.

A ministra apontou, como fatos incontroversos no processo, que a doação ocorreu na época em que o falecido possuía mais de 2 milhões de dólares em ativos financeiros no exterior, e que o imóvel em discussão não valia mais do que 50% de tais ativos.

A relatora, nesse passo, ressaltou que é irrelevante saber se os demais bens existentes ao tempo do ato de liberalidade foram, ou não, efetivamente revertidos em favor dos herdeiros necessários após o falecimento do doador ou se os referidos bens compuseram, ou não, o acervo hereditário. Isso pois, somente importa definir se ano da doação, o bem imóvel doado era representativo de mais de 50% do patrimônio total do doador – e isso, conforme se viu, não ocorreu”, concluiu.

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Para STJ, todos os executados devem ser intimados da nomeação do avaliador de imóvel penhorado

​A 3a Turma do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do RESp 2.022.953, definiu que todos os executados devem ser intimados do despacho que nomeia o perito avaliador de imóvel penhorado, independentemente de quem seja o proprietário do bem, observando-se os termos do artigo 465, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil (CPC).

Com base nesse entendimento, o colegiado anulou acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná – que avaliou a medida como desnecessária – e restabeleceu a determinação do juízo da execução para intimar todos os executados, reconhecendo ainda a ocorrência de preclusão consumativa sobre a questão, por ter sido objeto de decisão anterior contra a qual não foi interposto recurso.

A origem do caso foi uma ação de execução de título extrajudicial na qual o juiz converteu em penhora o arresto dos imóveis de propriedade de um dos executados e expediu carta precatória para a avaliação dos bens. Após a determinação para que as partes se manifestassem sobre a nomeação do perito avaliador, o exequente apresentou petição alegando a desnecessidade de intimação de todos os executados, mas o pedido foi indeferido. Em reconsideração, o magistrado revogou a ordem de intimação dos demais executados.

Por entender que não caberia reconsideração do posicionamento por parte do juízo da execução, o proprietário dos imóveis recorreu ao TJPR, mas a corte estadual manteve a decisão sob o argumento de que a diligência envolvendo todos os executados atrasaria o cumprimento da carta precatória.

De acordo com a relatora no STJ, ministra Nancy Andrighi, ocorre preclusão consumativa de determinada questão, na forma dos artigos 505 e 507 do CPC/2015, quando ela já foi expressamente acolhida ou afastada por decisão judicial e os recursos possíveis foram julgados ou não foram interpostos.

Nessa situação – explicou a ministra –, é vedado ao juiz, de ofício ou a requerimento, reconsiderar ou alterar a sua decisão anterior, salvo nas hipóteses previstas em lei e o agravo de instrumento é o recurso adequado para questionar decisão interlocutória proferida em processo de execução, mas ele não foi utilizado.

Assim, afirmou a ministra, a reconsideração, correção ou acréscimo da decisão anterior, em violação à preclusão consumativa, acarretará a invalidação da alteração realizada pelo novo ato decisório.

A Ministra Nancy Andrighi destacou, também, que o fato de os imóveis penhorados serem de propriedade de apenas um dos executados não afasta o direito dos demais à intimação do ato processual em questão, pois eles têm interesse na avaliação, que é uma das formas de quitação (integral ou parcial) da dívida com o exequente.

Acrescentou, ainda, que a intimação das partes consolida o exercício do contraditório, ao permitir que todos se manifestem sobre eventuais incorreções na nomeação do perito avaliador. Para a relatora, não se pode presumir que o titular do bem avaliado fará todas as alegações que os demais executados fariam, sendo plausível a ocorrência de deficiência técnica, perda de prazo ou mesmo a falta de manifestação por parte do proprietário.

Logo, todos os executados devem ser intimados do despacho de nomeação do perito avaliador do imóvel penhorado, na forma do artigo 465, parágrafo 1º, do CPC, independentemente de quem seja o proprietário do bem constrito.

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STJ decide que juiz não pode arbitrar valor de imóvel penhorado com base na regra de experiência

​A 3a turma do STJ. ao examinar o REsp 1.786.046, decidiu que, só se autoriza a utilização do conhecimento técnico ou científico do juiz, com dispensa da perícia, quando o fato se fundar em experiência de aceitação geral.

No caso analisado, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em processo executório, fixou o valor de um imóvel penhorado com base na regra de experiência, dispensando a perícia técnica, com base no artigo 375 do Código de Processo Civil (CPC) – que autoriza o juiz a se valer das regras da experiência comum para julgar o feito.

Segundo o relator do recurso no STJ, ministro Moura Ribeiro, as regras da experiência comum, previstas no CPC, designam um conjunto de juízos que podem ser formulados pelo homem médio a partir da observação do que normalmente acontece.

Essas regras exercem diversas funções no processo – por exemplo, auxiliam o juiz a entender e interpretar as alegações e o depoimento das partes, para melhor compreender certas palavras e expressões em ambientes e circunstâncias específicos.

Sob essa perspectiva, também se pode afirmar que elas auxiliam na aplicação de enunciados normativos abertos, informando e esclarecendo conceitos jurídicos indeterminados, bem como pavimentam a construção do raciocínio lógico e estruturado que põe limites à atividade jurisdicional e permite a prolação de uma decisão verdadeiramente fundamentada.

No entanto, o ministro alertou que, muito embora constituam um conhecimento próprio do juiz, as regras da experiência não se confundem com o conhecimento pessoal que ele tem a respeito de algum fato concreto.

Afirmou o ministro, nessa toada, que o juiz pode valer-se de um conhecimento empírico ou científico que já caiu em domínio público para julgar as causas que se lhe apresentam, porque, em relação a essas questões, não há necessidade de produzir prova, porém não está autorizado a julgar com base no conhecimento pessoal que possui a respeito de algum fato específico, obtido sem o crivo do contraditório.

O ministro Moura Ribeiro ainda lembrou que os conhecimentos técnicos não universalizados demandam prova específica – como adverte a parte final do artigo 375 do CPC e, no caso dos autos, não há como afirmar que o valor do bem penhorado, considerando suas grandes dimensões, localização e conformação específica.

Vael dize, no caso, o homem médio não tem condições de afirmar se o imóvel em questão vale R$ 101,5 milhões, como indicado pelo perito; R$ 390 milhões, como apurado na Justiça do Trabalho, ou R$ 150 milhões, como afirmado pelo desembargador do TJRJ.

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STJ decide que direitos aquisitivos de contrato de promessa de compra e venda não registrado podem ser penhorados

​A 3a Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao examinar o  REsp 2.015.453, decidiu que direitos aquisitivos decorrentes do contrato de promessa de compra e venda, mesmo quando ausente o registro do contrato e na hipótese de o exequente ser proprietário e vendedor do imóvel, podem ser objeto de penhora.

O caso analisado, no âmbito do contrato de venda de imóvel, após o não pagamento de duas promissórias oriundas do contrato, a vendedora buscou judicialmente a penhora dos direitos da compradora sobre o imóvel.

O juízo de primeiro grau negou o pedido sob o entendimento de que não houve averbação do contrato na matrícula do imóvel e que o bem ainda estaria inscrito em nome da vendedora. A decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

No recurso especial, a vendedora defendeu a desnecessidade do registro do contrato de compra e venda e a irrelevância do imóvel ainda estar em seu nome para fins da penhora.

A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, destacou que não há, em tese, restrição legal para a penhora dos direitos aquisitivos decorrentes de contrato de promessa de compra e venda, ainda que o exequente seja promitente vendedor ou proprietário do imóvel e que o contrato não tenha sido registrado.

A ministra destacou uma inovação do atual Código de Processo Civil, que prevê, no inciso XII do artigo 835, a penhora dos direitos aquisitivos derivados de promessa de compra e venda e de alienação fiduciária em garantia. Ela lembrou que, nestes casos, a penhora não recai sobre a propriedade do imóvel, mas sim sobre os direitos que derivam da relação obrigacional firmada – promessa de compra e venda.

A penhora sobre os direitos aquisitivos, portanto, incide sobre os direitos de caráter patrimonial decorrentes da relação obrigacional (promessa de compra e venda) e não sobre a propriedade do imóvel.

A relatora observou que a medida buscada com o recurso pode recair sobre quaisquer direitos de natureza patrimonial, sem qualquer ressalva legal ou exigência especial em relação aos direitos aquisitivos derivados da promessa de compra e venda.

A ministra afirmou, também, que o direito real de aquisição surge com o registro do contrato, mas antes dessa etapa já existe o direito pessoal derivado da relação contratual, cujo pagamento pode ser exigido entre as partes.

Com isso, concluiu a ministra que o credor dos direitos aquisitivos penhorados os adquirirá no estado em que se encontrarem, sejam de caráter pessoal, sejam de caráter real. Não obstante, a conclusão que se impõe é que a mera ausência do registro do negócio jurídico não impede o exercício da penhora.

A relatora destacou, ainda, que, na penhora dos direitos aquisitivos do executado, não tendo ele oferecido embargos ou sendo estes rejeitados, o artigo 857 do CPC/15 estabelece que o exequente ficará sub-rogado nos direitos do executado até a concorrência de seu crédito.

Nesse contexto, na hipótese de o executado ser o titular dos direitos de aquisição de imóvel e o exequente ser o proprietário desse mesmo bem, poderá ocorrer tanto a sub-rogação, com a consequente confusão, na mesma pessoa, da figura de promitente comprador e vendedor, ou, alternativamente, a alienação judicial do título, com os trâmites pertinentes à consecução do valor equivalente, de acordo com artigo 879 e seguintes do CPC/15.

No mais, a ministra enfatizou que não permitir a penhora sobre os direitos aquisitivos pode colocar o exequente/promitente vendedor em desvantagem em relação aos demais credores, uma vez que é com o ato de constrição que nasce o direito de preferência na execução, nos termos do artigo 797 do CPC.

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STJ: Prestações não previstas em acordo e vencidas após a homologação não podem ser incluídas na execução

A 3a Turma do STJ, ao julgar o  REsp 1.840.908, decidiu que, na execução de sentença homologatória de acordo entre credor e devedor, se a transação abrangeu apenas o período objeto da ação de cobrança, não é possível incluir as prestações sucessivas vencidas e não pagas após a homologação, pois isso ofenderia a coisa julgada.

Com esse entendimento, a Turma afastaou a cobrança de despesas condominiais formalizada em uma ação de cobrança movida pelo condomínio. Na audiência de conciliação, foi feito acordo, que acabou homologado em sentença.

Como o pacto só foi cumprido parcialmente, o condomínio deu início à execução e apresentou o demonstrativo de débito, incluindo as parcelas ajustadas no acordo. A devedora, então, pagou o valor inicialmente cobrado, nos termos da transação homologada, e pediu a declaração de extinção da execução.

O juízo de primeiro grau, contudo, determinou a remessa dos autos à contadoria judicial, para que fosse feita a inclusão, em memória de cálculo, dos valores referentes a parcelas vencidas e não pagas após a homologação do acordo. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) negou provimento ao recurso da condômina, sob o fundamento de que, diante das características das despesas executadas, periódicas e sucessivas, nos termos do artigo 323 do Código de Processo Civil (CPC), as parcelas não pagas no curso do processo deveriam ser incluídas na condenação.

O relator do recurso no STJ, ministro Moura Ribeiro, observou que, conforme a jurisprudência da corte, embora o artigo 323 do CPC admita a inclusão, na sentença condenatória, das prestações que vencerem e não forem quitadas no curso da demanda, tal providência é vedada em cumprimento de sentença, sob pena de ofensa à coisa julgada.

O ministro ressaltou que, no caso em discussão, em respeito à coisa julgada, a execução da sentença deve ser limitada, por conta de expressa opção das partes em torno da abrangência da transação. Dessa forma, segundo o magistrado, não se pode ampliar por critério de conveniência ou economia processual o alcance natural da cobrança, a fim de incluir prestações vencidas após a homologação.

Explicou-se, ainda, que a transação, como ato de vontade das partes na livre disposição de seus interesses, conserva a plena possibilidade de limitação do alcance das obrigações. Segundo ele, uma vez homologado o acordo, não cabe pretender a inclusão das taxas condominiais que venceram após a homologação, tendo em vista o conteúdo específico da transação, que abrangeu apenas o período a que se referia a ação de cobrança.

Com isso, concluiu que, no caso, o título executivo judicial não dispôs acerca da possibilidade de execução, a partir dos mesmos autos, de eventuais taxas de condomínio ou acessórios vencidos após o referido acordo. Assim, em respeito à coisa julgada, não se pode incluir débitos condominiais vencidos após a composição celebrada entre as partes.

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STJ admite relativizar impenhorabilidade do salário para pagamento de dívida não alimentar

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o EREsp 1874222, estabeleceu que, em caráter excepcional, é possível relativizar a regra da impenhorabilidade das verbas de natureza salarial para pagamento de dívida não alimentar, independentemente do montante recebido pelo devedor, desde que preservado valor que assegure subsistência digna para ele e sua família.

O colegiado acompanhou o relator, ministro João Otávio de Noronha, para quem essa relativização somente deve ser aplicada “quando restarem inviabilizados outros meios executórios que garantam a efetividade da execução”, e desde que “avaliado concretamente o impacto da constrição sobre os rendimentos do executado”.

Os embargos de divergência foram interpostos por um credor contra acórdão da Quarta Turma que indeferiu o pedido de penhora de 30% do salário do executado – em torno de R$ 8.500. A dívida objeto da execução tem origem em cheques de aproximadamente R$ 110 mil.

A Quarta Turma entendeu que a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que a regra geral da impenhorabilidade das verbas de natureza salarial comporta exceção nas seguintes hipóteses: a) para o pagamento de prestação alimentícia de qualquer origem, independentemente do valor da remuneração recebida; e b) para o pagamento de qualquer outra dívida não alimentar, quando os valores recebidos pelo executado forem superiores a 50 salários mínimos mensais, ressalvando-se eventuais particularidades do caso concreto. Em ambas as situações, deve ser preservado percentual capaz de assegurar a dignidade do devedor e de sua família.

Contudo, o credor apontou precedentes da Corte Especial e da Terceira Turma que condicionaram o afastamento do caráter absoluto da impenhorabilidade das verbas de natureza salarial apenas ao fato de a medida constritiva não comprometer a subsistência digna do devedor e de sua família, independentemente da natureza da dívida ou dos rendimentos do executado.

Segundo o ministro João Otávio de Noronha, a divergência estava em definir se a impenhorabilidade, na hipótese de dívida de natureza não alimentar, estaria condicionada apenas à garantia do mínimo necessário para a subsistência digna do devedor e de sua família ou se, além disso, deveria ser observado o limite mínimo de 50 salários mínimos recebidos pelo devedor.

Para o relator, o Código de Processo Civil, ao suprimir a palavra “absolutamente” no caput do artigo 833, passou a tratar a impenhorabilidade como relativa, permitindo que seja atenuada à luz de um julgamento principiológico, em que o julgador, ponderando os princípios da menor onerosidade para o devedor e da efetividade da execução para o credor, conceda a tutela jurisdicional mais adequada a cada caso, em contraponto a uma aplicação rígida, linear e inflexível do conceito de impenhorabilidade.

O ministro afirmou que esse juízo de ponderação deve ser feito à luz da dignidade da pessoa humana, que resguarda tanto o devedor quanto o credor, e mediante o emprego dos critérios de razoabilidade e da proporcionalidade.

O ministro acresceu que a fixação desse limite de 50 salários mínimos merece críticas, na medida em que se mostra muito destoante da realidade brasileira, tornando o dispositivo praticamente inócuo, além de não traduzir o verdadeiro escopo da impenhorabilidade, que é a manutenção de uma reserva digna para o sustento do devedor e de sua família.

Dessa forma, o relator entendeu que é possível a relativização do parágrafo 2º do artigo 833 do CPC, de modo a se autorizar a penhora de verba salarial inferior a 50 salários mínimos, em percentual condizente com a realidade de cada caso concreto, desde que assegurado montante que garanta a dignidade do devedor e de sua família.

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STJ fixa contrapartida para proteção do imóvel da empresa usado para moradia

A 4a Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp 1.514.567, concluiu que o Poder Judiciário pode oferecer ao imóvel de propriedade da empresa, que é usado para moradia dos sócios, a proteção contra penhora que a Lei 8.009/1990 confere aos bens de família. Mas, em troca, o patrimônio pessoal dos empresários poderá ser alcançado para saldar a dívida, caso necessário.

O caso analisado envolve a cobrança de uma dívida por meio da penhora de quotas sociais de uma empresa de propriedade dos devedores, cujos socios se insurgiram porque o capital da pessoa jurídica é composto por um imóvel usado por eles próprios como moradia. Requisitaram a desconsideração positiva da personalidade jurídica, na qual a autonomia patrimonial entre empresa e sócios é rompida não para alcançar, mas para proteger um bem, no caso a residência da família.

Para o Tribunal de Justiça de São Paulo, o imóvel pode ser penhorado porque pertence à pessoa jurídica e a proteção de impenhorabilidade prevista pela Lei 8.009/1990 se restringe aos bens de família das pessoas físicas.

A jurisprudência do STJ, no entanto, tem diversos precedentes indicando a possibilidade de considerar impenhorável o imóvel de empresa que é usado como residência. A posição se baseia no escopo da lei de conferir ampla proteção ao direito de moradia.

Em seu voto, a ministra Isabel Gallotti destacou que o uso dessa medida na jurisprudência do STJ, inicialmente, limitou-se aos casos de imóvel de pequenas empresas familiares, cujas quotas são inteiramente pertencentes aos devedores e seus familiares.

A tese, mais tarde, passou a ser aplicada de maneira indistinta, sem observar a circunstância que justificou a flexibilização do princípio da autonomia patrimonial. Por isso, a relatora propôs a definição de algumas medidas para balancear os julgamentos sobre o tema.

Para a ministra, a desconsideração da personalidade jurídica de empresa proprietária do imóvel no qual residem seus sócios, para que esse bem seja considerado impenhorável, só pode ser feita na hipótese de pequena empresa familiar.

Também deve-se levar em conta a boa-fé do sócio morador. Isso implica analisar, caso a caso, se há indícios de que, por exemplo, o imóvel já era usado como moradia antes do vencimento da dívida ou se, ao contrário, passou a ser justamente para evitar sua penhora.

Condutas como a compra pela sociedade de imóveis residenciais para a moradia dos sócios, de forma a destituir a empresa de patrimônio apto a servir de meio para a satisfação das obrigações contraídas no giro de seus negócios, não devem dar ensejo a esse tipo de desconsideração.

Por fim, destacou que a desconsideração da personalidade jurídica deve ser uma via de mão dupla. Se é possível tornar o imóvel da empresa impenhorável para garantir a moradia dos devedores, também deve ser possível atingir o resto do patrimônio pessoal deles para saldar a dívida.

A tese foi acolhida pelos ministros da turma, mas não foi aplicada no caso concreto porque não há certeza sobre o imóvel ser, de fato, residência da família dos devedores. Como o acórdão não apreciou a prova sobre o tema, determinou-se o retorno dos autos às instâncias ordinárias para novo julgamento.

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STJ: Penhora on-line de ativos financeiros não depende da indicação de contas do devedor

A 3a Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que, para autorizar a penhora on-line, os requerentes não precisam fornecer os dados bancários, nem é necessário observar periodicidade mínima ou eventual mudança de situação fática em relação à última tentativa de penhora.

O caso analisado trata-se de ação de alimentos, em cuja fase execução, não foi possível localizar patrimônio penhorável suficiente. Com isso, os autores pleitearam o bloqueio de ativos financeiros, o que foi indeferido pelo juiz. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) manteve a decisão, sob o fundamento de que, para evitar a prática de crime pelo magistrado, a parte deveria ter indicado os dados das contas do executado.

No recurso especial ao STJ, os recorrentes sustentaram que não existe previsão legal para as exigências feitas pela corte local, bem como não haveria abuso de autoridade por parte do magistrado ao determinar a penhora on-line.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que a matéria acerca do pedido de indisponibilidade de ativos financeiros está disciplinada no artigo 854, caput e parágrafos 1º a 9º, do Código de Processo Civil (CPC), que descreveu a atuação das partes e do juiz detalhadamente.

Assim, observado o rito previsto em lei para a decretação de indisponibilidade de ativos financeiros, não há que se falar, nem mesmo em tese, de ato judicial tipificável como crime.

A ministra ressaltou que, por falta de previsão legal, não se pode condicionar o bloqueio de valores ao fornecimento dos dados bancários do executado pelo credor, tampouco a uma periodicidade mínima ou à modificação de alguma circunstância factual.

A ministra apontou também que, nos termos da lei, cabe ao executado demonstrar a impenhorabilidade dos valores para obter a sua liberação, bem como que, para a aplicação do artigo 36 da Lei 13.869/2019 (Lei de Abuso de Autoridade), além do dolo específico, é exigido que o magistrado não corrija o bloqueio indevido, após a demonstração do executado.